Quarta-feira, 30 de setembro de 2020 (september ends)
No começo da quarentena, cinco meses atrás, numa reunião para o planejamento de uma escala de trabalho na pandemia, ouvi do diretor da empresa onde trabalho que as previsões dos consultores e executivos a respeito da volta ao regime normal seria só pelo final de setembro. O grupo que gerencia a empresa hoje é um desses grupos empresariais atuais que parece entender de tudo o que eu, na minha simplória visão de simples colaboradora, resumo em 3 Ps: Previsões, Planejamentos e Projeções. São profissionais nisso! Ainda assim, achei uma previsão pessimista, na época.

Conversando com um colega de trabalho sobre a pandemia e sobre o número crescente de óbitos, no final de maio, também achei exagerada a previsão pessoal dele, que achava que até agosto teríamos 60000 óbitos no Brasil.
Mas, tem um ditado velho e popular, que talvez as gerações mais novas não conheçam, que diz que em terra de sapos, de cócoras com eles, não é assim? A gente aprende até a língua dos sapos, nunca ninguém duvide disso! Então, nas questões não-práticas – não tenho empresas para administrar – também fiz os meus 3 Ps.
Numa das primeiras vezes que falei aqui sobre a covid-19 (a virose ainda era mais popular como coronavirus, na época), falei um pouco sobre o que se falava muito na época: aclamação de heróis, pessoas melhores, planeta limpo, animais felizes… Todas aquelas coisas que o povo da gurulândia e das altas e baixas cúpulas propagandeavam. Fiz minhas próprias previsões a respeito disso, também. Foi o meu primeiro P.
Sobre planejamento, no entanto, confesso que não fui muito longe. Não tenho empresas para administrar, já disse antes! Nesse tempo de incertezas a respeito de tudo, meus planos nunca iam além de uma semana adiante e eu me limitei a tentar vivenciar angústias ou alegrias, cada uma na sua vez. Segundo P (que pode ter sido de pífio, também. Mas serviu!).
Já pelas projeções, por estas eu passeei muito. A imaginação é uma palavra de destaque no meu pequeno dicionário de relevâncias pessoais. A curiosidade também. Quando se juntam as duas num lugar só, sem muita coisa para fazer, a coisa vai longe, e imaginar as consequências do hoje no amanhã foi um exercício bom. O terceiro P foi, no mínimo, divertido.
E agora nós chegamos ao final de setembro, tempo do normal retornar, segundo as previsões dos meus chefes. Empresa lotada, trabalho de volta ao antigo patamar e ponto para eles. No Brasil, mais de 140000 mortos pelo vírus, superando em muito a previsão dos 60000 daquele meu colega – ponto para ninguém, muito menos para ele, que contraiu a doença e mesmo agora, depois de dois meses, ainda se recupera dela.
E aí eu venho com as minhas:
Não vejo mais heróis voando por aí nem flutuando nas mídias; foram curtos os seus minutos de fama. Praias lotadas, divididas entre os humanos e o lixo produzido por eles não propiciam exatamente um ambiente ideal para a desova das tartarugas, eu acho. O leopardo-das-neves deve sumir de vista novamente (sabe Deus quem ou o que a Rússia usou como cobaia pra vacina, não é?). O trânsito voltou a ficar pesado e os bares, o Instagram e o Facebook voltaram a se encher de pessoas tão melhores depois da pandemia quanto o foram sua vida inteira. Se tanto. Nenhuma surpresa até aqui.
Recentemente, na primeira escapada que eu dei, fomos encontrar minha filha e o namorado no meio das Montanhas de Minas. Nós estávamos de folga mas eles não, no primeiro dia. Enquanto saí com meu marido para uma caminhada, minha filha ficou trabalhando on-line, na varanda de seu chalé, com uma vista de tirar o fôlego aos seus pés. Retornando da caminhada mais tarde, encontramos o namorado dela em uma reunião on-line, pegando um pouco de sol num dia frio, com aquela mesma vista ao fundo. Hoje saí bem cedo para trabalhar deixando meu marido em casa, no teletrabalho. Quando cheguei à tarde, meu filho fazia prova da faculdade diretamente do seu quarto. E assim as maravilhas do novo normal (vocês já sabem!) apresentam-se para mim, que só posso me maravilhar pelos outros. Tenho internet boa mas meu trabalho é essencialmente presencial e braçal, literalmente falando, e nenhuma das projeções desse wonderful world servirá para mim, neste sentido, infelizmente.
Mas, vivendo entre a coragem e o IgG negativo (se o positivo vale, só o tempo vai dizer), sobre planejamento ainda só consigo pensar num prazo razoavelmente curto. Ainda falta uma certa segurança que, no entanto, não me paralisa totalmente: já penso em pequenas férias. Não muito longe mas longe de tudo, do jeito que eu gosto. Antes eu pensava nisso como um antídoto contra o veneno do mundo e agora além disso ainda tem o vírus… E além do mais – dizem por aí, também – a vida é o que acontece enquanto fazemos planos. Quem sabe, então, isso talvez não venha a ser minha vacina particular, né? Vai saber…
Por enquanto, fé na vida e vamos em frente!
A vida é o que acontece enquanto fazemos planos, previsões e projeções! E a vida detesta estes três Ps. Ela é especialista em contradizê-los! Melhor então vivermos, com responsabilidade e fé, que um dia o normal chega…Bela crônica!
CurtirCurtido por 1 pessoa
Com certeza! Obrigada.
CurtirCurtir
Nunca tinha ouvido falar dos 3 Ps, mas acho que sempre acabei usando sem querer para controlar ilusões. No começo eu achei que seria terrível, que íamos todos morrer. Depois acabei me acostumando agora com a rotina. E hoje eu vejo que é isso aqui mesmo. Não estamos vivendo num filme. A vida que continua.
Gostei muito do texto e do seu blog!
CurtirCurtido por 1 pessoa
Na verdade os 3 Ps são só a minha maneira própria de ver essas coisas. Por aqui a gente inventa. Obrigada, mesmo assim. Que bom que gostou do blog!
CurtirCurtido por 1 pessoa
Planejamento, previsões e projeções são interessantes como referência, alvos a serem buscados.
Requerem atualizações permanentes e, com frequência, são atropelados no curso normal da vida, algumas vezes por “cisnes negros” que revertem totalmente o dito padrão de normalidade. É a vida…
CurtirCurtido por 1 pessoa
Verdade. Nós precisamos ter algum norte para o curso da vida. E o plano B e a coragem para avançar no alfabeto deles, à medida que forem falhando…
CurtirCurtir