Domingo, 16 de maio de 2021 (dia de nada)

No domingo passado, segundo domingo de maio, foi comemorado o dia das mães. Minha filha veio nos visitar no fim de semana, em razão da data. Passei quatro dias “chocando”, como dizemos por aqui, numa referência à galinha com seus pintinhos. No sábado de manhã, enquanto fazia o almoço e esperava meus filhos acordarem, escutava música com meu marido, no modo aleatório do YouTube Music. Em homenagem ao Dia das Mães foi minha a escolha da música inicial (uma psicodelia do Sérgio Sampaio) e a partir dela, com o YouTube “seguindo a luz”, como diz meu marido, só tocou música linda. É como escutar rádio só que dá para pular as chatas. Num certo momento começou a tocar Gilberto Gil, de quem eu não sou muito fã, e eu já ia pular quando mudei de ideia e resolvi escutar. Ouvi e acabei chorando um pouquinho. Corta para o Dia das Mães.

Sempre achei estas datas comemorativas meio chatas, mesmo quando meus filhos eram pequenos. O trauma vem de longe, do tempo das indefectiveis festinhas das mães na escola. Eu não gostava delas! Não gostava quando era criança e continuei não gostando na infância dos meus filhos. Mesmo que isto soe até herege para alguns, é verdade e hoje eu nem tenho mais vergonha de admitir isso. Meus filhos estão crescidos e têm mentes abertas e já podem conviver com isso. Quando criança eu era muito tímida e para mim era um sacrifício indescritível aquelas apresentações que éramos obrigados a fazer no colégio: cantar, declamar poemas, pecinhas de teatro e outras atividades que os professores inventavam para homenagearmos nossas mães. O tempo dos meus filhos já foi um tempo em que o problema era outro: o colégio achava que não tinha nenhum problema perdermos uma manhã ou uma tarde inteira em brincadeiras e gincanas e sei lá mais o quê para comemorar a data, com o intuito de promover, assim (sai dizendo), uma interação maior entre os filhos e as mães e/ou os pais. E como se o resto do mundo tivesse que entender isso, também. Fala sério! Eu sempre tive que fazer verdadeiros malabarismos para poder comparecer a esses eventos e nunca tive um chefe fofo que apoiasse a causa com um sorriso de entusiasmo nos lábios e uma cara de “vai, sim, é importante!”. Mas, antes de ser crucificada, e em minha defesa, digo que nunca fui a elas de má vontade, no entanto; ia e entrava na dança com alegria e entusiasmo, e até curtia algumas… Eu apenas achava desnecessário e alegórico demais que a integração e as homenagens fossem determinadas para um dia específico (como se dia das mães, dos pais, das crianças etc, não fosse todos os dias – já dizia meu pai). O apelo comercial eu até entendo, o comércio vive disso, afinal! Mas no colégio… Não sei das outras famílias mas aqui em casa meus filhos aprenderam o valor da interação com os pais desde cedo. Brincadeiras, leituras, filmes, tempo livre para conversar besteira… Como eu chegava tarde, ninguém dormia antes das onze da noite e a quantidade de tempo que eu não tinha sobrando procurei – procuramos, na verdade – converter em qualidade desse mesmo tempo. Foi uma aventura e tanto, no fim das contas, é só como eu posso resumir.
A maneira como criei meus filhos foi muito diferente daquela em que fui criada. Minha mãe era aquela mãe estilo “rainha do lar” (ela é a dona de tudo/ ela é a rainha do lar, como na musiquinha chata do colégio). Como ela não trabalhava fora, o único provedor material da família era meu pai, mas ela nos enchia do que não era matéria: amor, carinho, atenção, cuidados… nada disso faltou para nós. E tinha bolos de chocolate, também. Já o meu pai era mais rígido, embora interagisse e se interessasse muito mais com os filhos do que a maioria dos seus amigos contemporâneos, pelo que me lembro. Ele gostava de andar conosco, de inventar aventuras de estrada e sempre teve orgulho de nós todos. Mas era duro, ainda assim!

Apesar das diferenças gritantes na educação dos filhos, mantive muito de minha mãe em mim. De minha família toda, na verdade. Somos, como já disse algumas vezes, aqui, uma grande e complicada família que divide tudo, até os filhos. E hoje eles estão quase todos crescidos, só restam crianças duas menininhas adoráveis que crescem sem pena da nossa vontade que permaneçam pequenas. Culpa nossa, não, mas sim daquele implacável, poderoso e infalível senhor que não pára! Que coloca sua areia fina na palma das nossas mãos e deve se divertir assistindo às nossas tentativas de segurá-la e assim, segurá-lo… Mas ninguém segura o Tempo nem pode com ele! Filhos adultos e nós estarrecidos com isso: – O que foi feito de todo aqueles anos? Filhos trabalhando, saindo de casa e nós ainda meio inconformados. As férias dos filhos não são mais para nós e nós tendo que engolir o travo. E aí somos forçados a nos lembrar de que fomos nós que os criamos para ganharem o mundo. Somos pegos, então, na maliciosa armadilha que esta verdade encerra: criamos assim, criamos para isso… agora, como dizem por aí, a gente que lute!
Quando vivíamos todos juntos, eu, meu marido, minha filha e meu filho, minha exigência era pelo menos uma refeição com todos juntos, por dia. Hoje nós só temos o nosso tradicional ‘jantar de quinta’, por vídeo-chamada, mas a grande aventura com meus filhos continua boa e muito gratificante, mesmo assim. A gente que lute e é assim que tem que ser, e eu bem que tenho lutado, devo dizer. Até porque – e também não tenho vergonha de dizer – apesar de vibrar com cada nova conquista dos meus filhos, longe e/ou independentes de mim, meu sono mais tranquilo ainda é o que eu durmo sabendo que eles estão em seus quartos, na nossa casa, a um “vem aqui” de distância.
Acho que foi uma personagem de Stephen King quem disse que “casa é onde sempre querem que a gente fique mais”. Não consigo me lembrar do contexto e não anotei esta mas não tem como descontextualizar isso, eu acho. Esta frase resume, para mim, a definição de lar. Casa é onde fica o nosso lar! Em todas as vezes que fui à casa de meus pais, meu primeiro e eterno lar, nunca deixei de ouvir de minha mãe, na hora de ir embora, a frase ‘ Ô, minha filha, não vá agora não…”. Lar é lugar de aconchego e não tem aconchego maior do que colo de mãe (Ok, de pai também…) Seguindo o exemplo de minha mãe, toda vez que minha filha vem para casa, no dia de sua partida brinco com ela, pedindo para ela não ir embora (“Vai não, Neném, fica aqui mais um pouquinho”), mesmo sabendo que a vida dela agora fica a mais de 2000 km de distância.
Dizem por aí, também, que nós nunca sairemos efetivamente da casa em que fomos criados e eu acredito nisso. Voltamos a ela sempre, dia das mães ou não. Mas sei também, no entanto, que existe sempre o perigo de que esta casa saia de nós. Sobre isto, por mim e por todos os que me são caros, peço todos os dias que não. Isto é pedir por Graças, eu penso. E, sobre Graças, o nome da minha mãe é Socorro, sua santa de devoção é Nossa Senhora do Perpétuo Socorro e a música do Gil que eu ouvi foi Tempo Rei.
Salve o Dia das Mães e as mães (e os pais) todos os dias!
“Pensamento
Mesmo o fundamento singular do ser humano
De um momento
Para o outro
Poderá não mais fundar nem gregos nem baianos
Mães zelosas
Pais corujas
Vejam como as águas de repente ficam sujas
Não se iludam
Não me iludo
Tudo agora mesmo pode estar por um segundo
Tempo rei, ó, tempo rei, ó, tempo rei
Transformai as velhas formas do viver
Ensinai-me, ó, pai, o que eu ainda não sei
Mãe Senhora do Perpétuo socorrei”
P.S: A palavra mãe, aqui, no sentido desta crônica, é quase um estado de espírito ou a personificação de um sentimento (e eu também não sou fã do Caetano Veloso, se é que alguém me entende), e por isto o texto vale para os pais também.
Bela crônica! Quanto aos nossos filhos, você é a mãe que qualquer criança gostaria de ter! Aos nossos filhos sempre demos asas, mas sempre deixamos bem claro que quando eles quisessem ser âncora, nossa casa sempre será a casa deles! Feliz dia das Mães!!
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Vamos seguindo com fé! Obrigada.
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